É madrugada
e o blecaute
cobre o bairro
de breu
Paraíso dos vazios
onde animais andam à espreita
Mas um som estribilha
e reverbera sobre todos
inaudível
subjugando os seres
da escuridão
agora apenas
zumbis eunucos
Tento responder
ao chamado
com um sussurro
constrangido e então
um uivo de dor
E não há resposta
As palavras vêm de longe
e não podem me escutar
como eu as escuto
“...eu o perdôo por isso...”
Pergunto-me
onde foi parar?
Onde está você
esta voz inalcançável?
Por que me chama?
Por que eu?
Por que agora?
Seria mais confortável acender as velas
e permanecer quieto
no quarto
acompanhado da solidão
como se somente não houvesse pago
a conta de luz
Seria oportuno!
Mas não há luz no mundo inteiro
onde as piores bestas
andam em bandos e se alimentam
umas das outras
A solidão é um luxo
que não merecem
Os ecos aos poucos inflamam
como numa tortura chinesa
e esta voz dilacera
corrói
infecciona
piora
devora a merda que tem nas minhas entranhas
decompõe o meu corpo perambulante aos pedaços
procurando alma viva
que não há
Não há ninguém
para consentir
ou negar
e eu espero feito louco
por uma resposta
detrás dos vultos
ao meu lado
Eu já dei a minha palavra
e já não sei o que fazer
para dizer o que preciso dizer
e você escutar
Quem sabe até
não sou um deles?
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