Arquivo pretensiosinho

terça-feira, 23 de abril de 2013

Meu amigo, Fundador do Mundo


Quando o conheci, mal sabia,
já tardava o Fundador do Mundo
a carregar-se de penas à mão.
“A leveza...”, diria ele, se soubesse
dizer de pesos e medidas
“...a leveza se mede pelo peso
de teus próprios ombros, rapaz”
Diria com propriedade avessa,
pois que nunca se carregou só,
ainda que convença do contrário.
Errante, como a mula guiando
à cabriola o espanhol sanguinário,
foi-se por aí ter com os nativos
de seu próprio mundo puído.
Levou das bainhas os gumes,
das estrelas banhos de negrume,
dos uivos a noite tremenda.
Carregou-se muito de pouco,
e preferiu o instinto à trilha.

Quando o conheci, estendeu-me
a mão. Onde vi fraternidade,
havia, na verdade, um grito de ajuda:
“Beije-me os dedos escalavrados,
glorifique este meu pútrido pedaço...”
As mãos que fundariam o mundo
clamando de mim o absurdo:
beijar leproso como a um santo.
Lázaro sem manto, Atlas anti
titânico, viga sem prumo.
Erigiu para si um túmulo,
e o fez com as pedras coalhadas
no próprio peito abscesso,
e nos rins desrimados.
Conquistador de elmo desalmado,
Francisco de ego inflado.
Como eu, mero observador barato,
resistiria às pérolas do mercante amigo?
Infeliz dele, e de quem o tocar.
Midas de petróleo, de asfalto.
A fama, também a carregou no bolso,
e acabou assim difamado e faminto.

Quando o conheci, me apresentou
o mundo que ainda não havia fundado,
conhecimento profundo, sobraçado.
“É isto que trago: um cigarro, uma cana...
só preciso disto e de uma cama
que não seja a minha própria.
É lá que se funda o mundo, rapaz
atrás dos morros de mulher,
donde morro cada vez
se me chego ou me afasto.
Os lábios, os lábios são o Fausto,
e a morte é o único e vasto campo
onde semeia Davi, o mais forte dos fracos”

Peço-lhe uma pena, Fundador,
pra fundir a tua à minha
pequena imagem de autor,
cuja sagra é só cocar menor,
eco do eco de teu melhor...

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